quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Devaneios Papareia: Parte I

“Rio Grande nunca vai mudar mesmo que mude. E pode mudar em toda e qualquer esfera a qual se possa imaginar. Pode acontecer o armagedom, a nova era glacial, que chegou a ser anunciada essa semana, ou quem sabe, um novo surto de peste que dizime 1/3 de sua população. Mesmo assim, Rio Grande permanecerá estática, imóvel como sempre esteve. A solução possível estaria, quem sabe, numa colonização intergalática. Talvez alienígenas poderiam modificar as coisas por aqui. Mesmo assim, continuo acreditando no potencial do povo riograndino. Enquanto existir o último resquício de vida papareia, nosso espírito será conservado”. 

A recente matéria publicada aqui no site sobre o turismo em Rio Grande é o reflexo de uma cidade imóvel, que mesmo após as mudanças do paço, continua tratando velhos assuntos e questões como sempre foram tratadas, ou seja, na base do coleguismo, do cabide de emprego, do despreparo profissional e da eterna confusão entre o público e privado.

Pensar hoje a cidade de Rio Grande, como elemento histórico social dentro dos mais diversos desdobramentos e fragmentações que isso possa ter, é justamente se transportar para outros momentos históricos. Nós historiadores adoramos fazer esse exercício dialético de passado/presente, presente/futuro. É uma ferramenta de trabalho. Vivemos tentando encontrar semelhanças, erros e acertos, no que já passou para não incorrer, no presente/futuro, no mais do mesmo.

As coisas funcionam assim e não sou eu que estou dizendo. Centenas de intelectuais já se debruçaram e escreveram teses sobre essa relação de definitiva existência do historiador com o tempo. Alguns deles escreveram para definir nossa real função e fazer a diferenciação entre historiador e futurólogo. Não somos, não temos esse poder. Particularmente, eu acharia bem legal. 

Fonte: acervo Papareia
Fonte: acervo Papareia
Para aqueles que, assim como eu, gostam de observar atentamente a realidade, o momento nunca foi tão instigante. Grandes investimentos no setor industrial, comércio aquecido, elevados custos na habitação, milhares de migrantes, trânsito beirando o caos, aumento da pobreza e da violência, invasões de terrenos, lixo sendo descartado em locais públicos, além, é claro, da nova gestão administrativa no governo da cidade.

Citei apenas esses exemplos e poderia aqui elencar muito outros, mas acredito que são suficientes para nossa problematização. Estamos falando de Rio Grande, a primeira cidade do Estado do Rio Grande do Sul, aquela que foi pioneira em diversas coisas. Primeira indústria têxtil, primeiro clube de futebol, primeiro balneário, primeira biblioteca...

Ao longo dos anos, Rio Grande cresceu em meio ao seu caráter cosmopolita sem saber qual era o significado dessa palavra, abrigando e recebendo estrangeiros das mais variadas nacionalidades, etnias, estados do Brasil e cidades do Rio Grande do Sul. Por conta de nossa posição estratégica favorável, possuímos um dos maiores portos do país e, disso, surge um de nossos principais enigmas.
Cidades cosmopolitas convivem, diariamente, com a diversidade. Esses lugares aprendem a viver com o distinto, explorando, abrigando e colhendo dessas relações sociais construídas no cotidiano, o que elas podem fornecer de melhor: a pluralidade cultural e o reconhecimento do outro.

Rio Grande talvez seja uma das raras exceções onde tudo deu e continua dando errado. O pluralismo cultural só funciona na Feira de Artesanato local, em que as etnias são apresentadas como heranças culturais válidas, onde o árabe pode andar de burca ou taqiyah sem ser atravessado por um olhar seguido de um comentário que tenta o ridicularizar em pleno centro comercial no século XXI. Onde os africanos podem cultivar e mostrar suas raízes sem serem taxados de “bando de macumbeiros”.

Rua Andradas -Anos60,Andradas 

O mesmo pluralismo cultural da feira, que reconhece as etnias, desconsidera a grande massa de trabalhadores pobres migrantes da região falida da campanha gaúcha, que foram os alicerces, braços, pernas e cérebros da cidade industrial mais importante do Estado do Rio Grande do Sul, nas primeiras décadas do século XX.

Em nossas raízes, somos o resultado dessa mistura de povos e regiões, imigrantes e migrantes. Portugueses, ingleses, espanhóis, italianos, poloneses, uruguaios, africanos, palestinos, sírios, libaneses, judeus, católicos, muçulmanos, umbandistas e adoradores do diabo. Além disso, somos ainda gaúchos e brasileiros. Rio Grande é sim, muito de toda essa mistura, mesmo que fatos como a imigração e migração nessas terras papareias tenham, muitas vezes, passado batido por trabalhos acadêmicos.

A mentalidade riograndina não permite inovação, é quase como heresia, predestinação divina ou seria castigo?

Algo do tipo: vocês nunca terão o protagonismo, seu papel se resume àquela personagem carismática que inicia alguma saga, ganha a simpatia do público e morre no meio da trama, passando o posto de mocinho/herói, ao colega de roteiro, a moça do lado.

Neste caso a moça do lado se chama Pelotas, uma cidade surgida duas décadas depois (1758), mas que vem pra roubar a cena com a sua beleza e inteligência de princesa e, assim que possível, transformar-se na personagem principal da região Sul. Historicamente, a cidade vizinha valorizou seus costumes locais, soube trabalhar muito bem com a diversidade cultural, explorou suas condições geográficas, abrigou colônias de imigrantes nas serras ao seu redor, deu valor a produção artística local, embelezou suas ruas e organizou um moderno traçado urbano em formato de tabuleiro de xadrez.

Assim Pelotas cresceu, centralizando na cidade toda a produção agrícola das colônias, explorando o comércio e a cultura local, importando refinados comportamentos, ganhou expressão nacional na produção de doces. O passado em Pelotas é visitado através da memória que não se cansa de recordar. A memória faz questão de aparecer, de ser mostrada através das fachadas de seus casarões e prédios históricos, reproduzidos até mesmo dentro de sua principal feira, a Fenadoce.

Fatos simples como esse, demonstram o quanto a política de valorização do patrimônio artístico cultural local é importante para a própria manutenção da economia urbana. Ou seja, Pelotas se projeta e se vende muito bem como cidade histórica.

Lembrando que os pelotenses, atualmente, ocupam a 8° posição no ranking do PIB do estado do Rio Grande do Sul, enquanto Rio Grande está no 4º lugar. Basicamente, a economia da cidade vizinha está apoiada no forte comércio local e em algumas pequenas indústrias de beneficiamento de alimentos. Além disso, conta com o forte apelo de ser uma cidade universitária.

Cabe aqui lembrar que Pelotas conseguiu transformar um pedaço de lagoa em praia, com direito a orla, pista de caminhada, trapiche, centro comercial, quiosques e estacionamento a poucos metros da água. Com um pequeno porto fluvial, impôs-se geoeconomicamente e ergueu grandes indústrias alimentícias, importantes para o desenvolvimento da cidade e da região sul na primeira metade do no século passado.

Texto publicado no site tucotuco em: 19/01/2014

Devaneios Papareia: Parte II

                                   Rua Duque de Caxias, início do Séc XX.
                                       Rua Duque de Caxias, início do Séc XX.
Em Rio Grande, durante muitos anos, a mentalidade reinante era a de que prédios velhos deveriam ser postos a baixo em troca de novos. Dentro desse pensamento, desapareceram dezenas, centenas de construções no centro da cidade. Quando estabelecemos comparação com os nossos vizinhos percebemos o enorme abismo que separa as duas cidades em relação às políticas de defesas do patrimônio artístico cultural, assim como fica evidente a mentalidade dessas duas cidades irmãs. Em Pelotas, a mentalidade é preservar para se vender.

Para esclarecer melhor essa ideia, menciono aqui o exemplo da Universidade Federal de Pelotas, que comprou/adquiriu inúmeros prédios históricos para construir seus centros de estudos e sedes administrativas. Mesmo que isso implique no aumento significativo dos gastos, é a expressão máxima de uma política bem definida de valorização do patrimônio local, custe o que custar. 

Atualmente, em Rio Grande, vivemos sob o escudo de cidade histórica. Uma cidade que se vende como histórica, mas que possui uma secretaria de turismo que pensa o turismo da mesma maneira como este era pensado na década de 1950. Uma cidade que se propaga como histórica, mas que não valoriza o patrimônio artístico cultural das fachadas de seus prédios, lugar onde os outdoors comerciais escondem a beleza de uma época em que a tradição e os valores de uma família eram esculpidos em cimento e mármore no alto das casas. 

Nessa mesma cidade, o patrimônio artístico-humano também é gravemente lesado; os músicos locais encontram cada vez menos lugares para exercerem o seu trabalho. Por trás disso tudo, a velha história do barulho e perturbação do sossego que ganhou nova roupagem de alvará de licença para música ao vivo. E com isso, vem toda uma pesada carga tributária que acaba resultando no final das contas na opção do empresário em investir 1/5 da grana tributada em um aparelho de som, projetor e uns dvd’s e a questão da música ambiente fica resolvida.

Rio Grande nunca vai mudar mesmo que mude, porque pensamos hoje da mesma forma como pensavam nossos avós. Quem ousa propor algo diferente por aqui é ridicularizado, vira sinônimo de piada entre os conterrâneos. Alguém lembra do Professor Filomena? 
Candidato por duas vezes a prefeito, Filomena era a personificação da inovação, a começar pelo o seu jingle de campanha. Professor universitário, surfista, homem viajado, esclarecido, trazia exemplos de cidades sustentáveis e propunha justamente o novo, fazer diferente pensando pra frente, com a mente aberta para o futuro. 

O que aconteceu com o professor Filomena não foi diferente do que acontece com quem pensa pra frente, desprendido do padrão papareia. Ele virou  sinônimo de insanidade, do impossível, piada, “meme” “fake”, ou seja lá o que for. Este fenômeno é digno do conservadorismo local, é digno de que vem vocifera em tribuna da câmara ou escreve coluna em jornal para defender a permanência de um fétido mini-zoo cravado em plena praça na zona central da cidade. É digno de quem passou gerações ensinando que diversão e entretenimento familiar é alimentar macacos, patos e gansos com pipocas. É ensinar que “tudo está no seu lugar graças a Deus”, porque ele quis assim e que devemos nós nos contentar com o que temos, sem alterar a ordem das coisas. É não aceitar o direito do outro de opinar, simplesmente pelo fato dessa pessoa pensar diferente do que a grande maioria pensa e, imagina como verdade.

Quando eu e o colega Felipe Nóbrega escrevemos um texto aqui no blog sob a região metropolitana, fomos acusados de estar defendendo a cidade de Pelotas, de estarmos nos voltando contra a nossa cidade natal, entre outras coisas. Mas o que na realidade imaginamos e escrevemos lá, é que Rio Grande nunca se pensou como a protagonista da região sul, sempre ocupou o lugar de secundária, exatamente por ser “amaldiçoada” por esse espírito conservador que paira sobre as mentes dos que a administram.

Nada, absolutamente nada, explica uma cidade portuária, que recebe cruzeiros internacionais, não ter pelo menos um funcionário em cada estabelecimento comercial que fale inglês, ou não ter lojas que aceitem compras em dólar. Fatos como esses explicam o porquê dos turistas lotarem vans para ir fazer compras na cidade vizinha.  Afinal de contas, uma cidade que dá as boas vindas para os turistas com danças de invernadas não merece muita coisa mesmo! 

A política de Rio Grande é o reflexo dessa mentalidade, temos hoje um prefeito novo, com ideias novas e algumas pessoas bem esclarecidas ao seu lado. No montante, o que vemos é um projeto vencedor, mas que comete os mesmos erros de sempre. O PT de Rio Grande venceu no cansaço, no desgosto do povo que almejava mudanças, mas incorre e esbarra nos mesmos erros de sempre. Funcionários administrativos incompetentes, viciados no ostracismo, cargos de confiança adquiridos no empunhar da bandeira que resultam no nada, em funcionários cuja única função é passar jogando Candy Crush nas redes sociais. 
Na câmara, a bancada de oposição, maioria, se organiza para barrar tudo e qualquer medida que vise “alterar o status quo”. Não importa se trará benefícios para o povo, o que vale é apontar os defeitos e impossibilidades, tudo é válido nesse jogo, inclusive misturar política e religião criando datas comemorativas para evangélicos. Afinal de contas, é sempre bom cuidar do nosso rebanho, né?

Como escreveu o pelotense Vitor Ramil em uma de suas letras, “a vida segue veloz nessa cidade no fim do fundo da América do Sul”. Aqui no meu canto, no escuro do quarto, continuo torcendo por mudanças, acreditando nas boas ideias e, quem sabe, na mudança de mentalidade de nosso povo. Mas do jeito que as coisas são, é mais fácil ser abduzido por uma nave espacial. 

Porque Rio Grande nunca vai mudar mesmo que mude. E aí, talvez outra frase da mesma música de Ramil ajude um pouco a entender com mais lógica ou quem sabe racionalidade, essa dinâmica histórica, psicossocial da nossa cidade: Rio Grande  se localiza entre o começo do inferno e fim do céu.

Texto publicado no site tucotuco em: 26/01/2014

Rio Grande, a pequena cidade da região metropolitana

Metrópole: Constitui um tipo especial de cidade, que se distingue das menores não apenas por sua dimensão, mas por uma série de fatos, quer de natureza quantitativa, quer de natureza qualitativa.  As atuais regiões metropolitanas tem como pontos comuns dois elementos essenciais: a) são formadas por mais de um município – o que lhe dá o nome – representando uma área bem maior que as demais; b) são objeto de programas especiais, levados por organismos regionais especialmente criados, com a utilização de normas e de recursos em boa parte federal. São, na verdade, regiões de planejamento, onde todavia, o que é feito não atende a problemática geral da área limitando-se a aspectos setoriais. (SANTOS, Milton, p. 75-76). A urbanização Brasileira 1994.

Autores: Felipe Nóbrega; Ticiano Pedroso
image_mini
Foto: divulgação
Quando da proposição de uma Região Metropolitana de Pelotas , Miriam Marroni não foi nada além de pelotense.

Tendo, até então, a sua cidade como sede de um aglomerado que ainda inclui: Arroio do Padre, Capão do Leão, Pelotas, Rio Grande, São José do Norte, Canguçu, Cerrito, Monte Bonito, Pedro Osório, São Lourenço do Sul e Turuçu. Não é nada exatamente novo, pois remete a uma iniciativa de Bernardo de Souza, ex-prefeito de Pelotas já falecido, e também existem ações nesse sentido por parte do deputado Catarina Paladini.

E repitimos, todos, apenas, foram pelotenses. E só. Sem escândalos, sem recalques, apenas publicizaram um ethos todo próprio, todo singular dessa cidade com ares de Paris, mas com um bairro chamado Sanga Funda e código de área 53.

E o que isso revela? Ou essa iniciativa, que já sofreu modificações, revela?
A completa incapacidade da cidade de Rio Grande ser protagonista na região, pelo simples fato de ser uma cidade que não consegue “se vender” como tal.
Um exemplo rápido: em Pelotas uma propaganda televisiva bate e rebate nas “maravilhas” da cidade, e a certa altura chega ao ponto de apresentar uma torre mequetrefe alocada em praça pública como uma réplica da Torre Eiffel.
Outro: qualquer, mas qualquer mafuá mesmo tem ou o jogo americano com referências a cidade, ou quadros, fotografias, enfim, qualquer elemento que possa confirmar o quanto Pelotas é a Paris dos pampas.

Ponte/limite entre RG e Pelotas/Foto: dos autores
Ponte/limite entre RG e Pelotas/Foto: dos autores
E Rio Grande, o que faz com o seu slogan de “Rio Grande, cidade do mar, cidade histórica?” Nada! Vale lembrar que a cidade não possui nenhum turismólogo no seu quadro do funcionalismo público, nunca houve concurso para tal.

O que temos hoje, em termos de recursos humanos que gerem a cidade na questão sócio-turística, é um grupo de pessoas que até são bem intencionadas naquilo que fazem, mas que não possuem a qualificação para pensar além da criação de mais e mais museus, como se isso fosse uma atitude de incremento turístico e valorização da cidade.

Nas redes sociais o assunto sobre a criação da região metropolitana de Pelotas aguçou o "ódio" dos riograndinos pelos “pelotenses metidos”. Alguns esbravejavam dizendo que “esta mulher só pode estar louca” , “cadê as nossas autoridades pra nos defenderem dessa crueldade?”

Na realidade essa prática pode ser facilmente entendida. Historicamente existe uma grande diferença entre as duas cidades, o qual remete para os seus respectivos passados gloriosos. Rio Grande sempre foi e será uma cidade industrial, isso explica muita coisa, quase tudo por aqui pode ser entendido por esta lógica (espero um dia poder provar). Por outro lado, Pelotas sempre foi um expoente cultural, "moderna", onde os valores locais são colocados em primeiro plano.

Rio Grande como cidade portuária, industrial, se contenta em ser um local por onde as pessoas passam, ganham dinheiro e vão embora. Não propicia a vontade de ficar, de permanecer nesta terra. Existem muitas poucas opções de escolha e a cidade se alimenta desta restrição.

Por outro lado, Pelotas estagnada economicamente há décadas, sobrevive em cima de sua condição de centralidade. Pois ela abrange uma série de pequenas cidades as quais justamente se abastecem no comércio local de Pelotas. A isso, também se agrega o questão educacional da cidade, que é um polo da região extremo sul, com suas universidades e campus do Instituto Federal.

Embora a cidade de Rio Grande detenha hoje o 4º maior PIB do Estado, esse valor não representa nenhum tipo de melhorias na qualidade de vida do cidadão papareia. Pois a cidade continua sobrevivendo com o mesmo leque de opções (salvo algumas exceções) a qual existia antes de 2008. Basta ver a quantidade de pessoas que se deslocam até a cidade vizinha em busca de diversão, lazer, opções culturais e compras no comércio.

Trocando em miúdos, a contradição da coisa toda é: Rio Grande nunca se pensou como protagonista da região, e Pelotas acredita que ainda ocupa esse lugar.

Pelotas já não é protagonista nem de novela mexicana do SBT desde 2008, quando da instalação de um Polo Naval em Rio Grande. Ali ficou estabelecido um futuro irreversível: se tornar uma cidade-dormitório. E com essa condição, onde ia parar o status da cidade, ou melhor, o ethos que ela carrega em cada uma de suas esquinas, e por tabela, está incorporado em cada um de seus nativos ?

Ora, em ações e projetos como esse, em que, no detalhe da vírgula, na forma inconsciente de organizar o mundo, sobressaem e deixam ver como Pelotas ainda pensa a si mesma.

Não que seja um projeto ruim em si, a justificativa é razoável, e faz sentido dentro do contexto de distribuição de verba para obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), agora, o que não faz sentido, é a forma completamente isolada com que Miriam tratou do assunto, pegando de surpresa a própria região e os seus colegas parlamentares dessas bandas.

Miriam já alterou o projeto, retirando o nome de Pelotas do título, e assim Rio Grande pode dormir tranquila. Porém, isso não esconde o fato de que, até hoje, pouco ou nada se fez nada no sentido de trazer para Rio Grande esse protagonismo turístico-social, bem como o próprio protagonismo econômico. Simples assim.

Sendo assim, o que resta, ao que parece, é viver de choro. Então, vamos todos guardar o nosso balde no pátio e esperar uma próxima oportunidade para chorar e reclamar de Pelotas, ou de qualquer outra cidade, pois o importante é manter a síndrome de primo-pobre, que não só incorporamos como mostra-se um lugar cômodo de viver.

Miriam_Paz_Garcez_Marroni
Foto divulgação Mirian Marroni


Texto publicado no site tucotuco em: 14/10/2013

Outro viés de informação

dsc_0337
O Filósofo francês Pierre Lévy, um dos maiores especialistas do mundo na cultura virtual
Enquanto me deparo com a página branca do programa Word, recordo do que tenho lido. Pierre Lévy, é um autor francês que atua na área da educação, comunicação, história, ciências sociais, filosofia, entre outras. É difícil enquadrá-lo dentro de uma caixinha do saber ou em estante da livraria. Suas pesquisas transitam entre muitas as esferas do conhecimento.

Em As Tecnologias da Inteligência, livro escrito no início dos anos 1990, Lévy apresenta o conceito de hipertexto[1], assim como faz um histórico de toda a evolução da tecnologia digital e, de alguma forma, “profetiza” o que mais tarde nós vivenciaríamos em nosso dia- a- dia.

Precisando escrever algo sobre mídia, comunicação, pensei justamente em apropriar-me melhor dos conceitos de Lévy, mas percebi que este livro está um pouco defasado com relação às tecnologias da informação. De certa forma, todos nós, mesmo não tendo nascido nos anos 2000, tornamo-nos (por obrigação ou curiosidade) um pouco “nativos digitais”.

E isso me faz pensar nas possibilidades existentes e também na fluidez do mundo contemporâneo. Enquanto uma obra da literatura, história, sociologia, entre outras da área das humanas demora anos, décadas, para ser descoberta, lida e virar uma referência no assunto, qualquer outro texto que verse sobre tecnologias desaparece e se torna ultrapassado na mesma velocidade em que se produz outro.
Quando falo em possibilidades, me refiro ao universo virtual o qual estamos inseridos, nas possibilidades de buscar o que quisermos com apenas um clique. Não tenho dúvidas de que a conjuntura vivenciada é um momento histórico, de profundas modificações em todas as atividades humanas. Você ainda tem dúvidas disso?

Quanto tempo você fica conectado a sua rede social por dia? Quantos dias você fica sem acessar o seu e-mail? 

Dentro disso, relações sociais são modificadas, novos comportamentos são criados e sujeitos estabelecem novos padrões de comportamento frente a uma sociedade que se apresenta mais acessível, mesmo tendo as suas limitações.

A televisão ainda continua sendo o maior meio de informação, o rádio também cumpre um papel crucial, mas, cada vez mais, ambos caminham para uma grande revista de variedades fúteis.
Engana-se quem acredita que a TV é democrática e que com o seu poderoso controle remoto é capaz de controlar os múltiplos canais que lhe custam ao final de cada mês uma boa e pesada parcela do salário. Digo isso, simplesmente, pelo fato de que nós somos, sim, enganados por esta inverdade do livre arbítrio do controle remoto. Nós escolhemos o que vamos ver, mas a escolha se dá dentro de uma opção que nos é dada, a partir de uma disposição do que podemos e estamos dispostos a desembolsar na mensalidade.

Isso não acontece quando nos sentamos na frente de um computador. Basta ter uma conexão à internet para que o sujeito comece a acessar o que ele deseja. Neste espaço/mundo virtual, as pessoas não estão obrigadas a “engolirem” um conteúdo, ao contrário, a própria ideia de navegador, de endereços, é o fator mais democrático e turístico que eu conheço. Basta digitar o site, ou chegar nele por meio de hiperlinks, para que o indivíduo se transforme em um verdadeiro navegador do mundo virtual.

Espaços antes impossibilitados, lugares talvez nunca visitados, materiais inacessíveis, tudo isso e muito mais, foi possibilitado pela rede mundial de computadores. E é esse acesso democrático à informação que deve ser valorizado e priorizado por todos nós.

Hoje em dia, as grandes corporações de jornais, revistas e televisão encontram dificuldades em lidar com uma nova forma de mídia que surgiu com o advento da internet. A mídia alternativa, independente, gratuita, cada vez mais conquista o seu espaço no grande público, fazendo uso justamente de programas e softwares livres para atingir os seus objetivos, a propagação. Essa talvez seja a maior vitória de todo esse processo, o acesso a informação gratuita e de livre escolha. A informação que se transforma em mecanismos lúdicos, de estudos, pesquisas, debates, lutas e transformações sociais.

O Tuco tuco nasce justamente engajado neste movimento da democratização da mídia, da propagação de informações ao livre acesso de todos. A iniciativa de juntar cinco blogueiros da cidade de Rio Grande foi materializada em uma mesa de bar, debatendo e expondo necessidades de se ter um veículo forte de informação que não esteja ligado a nenhuma corporação, e que, dentro disso, possa ter a liberdade para abordar temas que não são sequer mencionados na mídia tradicional.
Sejam bem vindos! Aproveitem o nosso espaço, leiam, curtam e compartilhem nossos materiais.

Texto publicado no site tucotuco em 13/09/2013

[1] Tecnicamente um hipertexto é um conjunto de nós ligados por conexões. Os nós podem ser palavras, páginas, imagens, gráficos ou partes de gráficos, sequências sonoras, documentos complexos que podem eles mesmos ser hipertextos. Os itens de informação não são ligados linearmente, como em uma corda com nós, mas cada um deles, ou a maioria estende suas conexões em estrela de moda reticular. Navegar em um hipertexto significa portanto desenhar um percurso em uma rede que pode ser tão complicada quanto possível. Porque cada nó pode, por sua vez, conter uma rede interna.
Funcionalmente, um hipertexto é um tipo de programa para a organização de conhecimento ou dados, a aquisição de informações e a comunicação. (LÉVY, Pierre, 1993, p. 33).

Contradições da mídia moderna

Programa Sala de Redação, Radio Gaúcha 10/10/2013, segundo bloco.

O debate se estendia a respeito de uma coluna da Zero Hora de hoje, em que a reportagem mostra o então presidente do Brasil, João Figueiredo, negando um pedido de realização da Copa do Mundo no Brasil em 1986, pedido esse feito por João Havelange, presidente da CBF na época.

Figueiredo alega  que existem outros problemas no Brasil para serem resolvidos, como as favelas e as secas no nordeste.

Então, o comunicador Lauro Quadros pronuncia a seguinte frase: "Por isso que eu tenho saudade da Ditadura".

Wianey Carlet diz: As pessoas que agora se manifestam contra a copa, eram pra se manifestar contra o Lula, foi ele que fez isso tudo, que trouxe a Copa. Quando anunciaram a copa as pessoas foram pra rua fazer festa.

Vejamos então: Quando a Copa do Mundo foi anunciada no Brasil, no ano de 2007, a grande mídia promoveu uma série de festividades para comemorar o anúncio. A Rede Globo patrocinou e fez a transmissão dos diversos shows que aconteciam na Praia de Copacabana.

Imagem

Aqui no Sul, a RBS também realizou uma série de reportagens a respeito do tema. Quase todas as matérias mostravam os benefícios que a vinda da Copa do Mundo poderia trazer à região, principalmente, aos empresários do ramo turístico e hoteleiro.
Em outubro de 2012, quando um grupo de manifestantes quebrou/furou o mascote da Copa do Mundo em Porto Alegre, a RBS repudiou o fato se colocando ao lado das empresas que estavam promovendo aquela ação de marketing no centro da capital gaúcha.  Inclusive, eu me lembro muito bem do comentarista Lasier Martins esbravejando a moralidade e os bons costumes e, obviamente, condenando o ato de vandalismo no Jornal do Almoço.
Imagem

O que mais chama atenção são o quanto as opiniões  vão sendo moldadas, modificadas conforme o contexto. Quando o grupo no qual tu trabalhas promove ações de marketing das gigantes patrocinadoras do evento, a Copa do Mundo é boa,  é aceitável e todos devem sair pra rua para fotografar e cultuar o Fuleco. Quando um grupo de pessoas não condizentes com a Copa se manifesta e depreda o mascote, eles são vândalos.

Quando esse movimento ganha proporções maiores e se espalha pelo país inteiro, a grande mídia também se vê ameaçada, uma vez que ela também é alvo das manifestações e protestos. A partir deste exato momento, a Copa se torna ruim, o discurso das ruas é incorporado,  é apropriado por aqueles que detêm o poder de transmitir e formar opiniões.

Neste momento, o foco da Copa do Mundo passa a ser justamente a falta de estrutura do país para receber o grande evento, passa a ser a carência por setores essenciais para a qualidade de vida do povo brasileiro. Isso tudo acontece depois que os estádios estão construídos, que milhões foram investidos e os patrocinadores já fecharam os contratos para o evento.
Neste momento, condenar o Lula e sentir saudades da Ditadura Militar é uma sensação extremamente aceitável.

Partido da Imprensa Golpista (PIG): estamos de olho!

 Imagem retirada do facebook na épocas das manifestações de Julho.

Texto publicado no site tucotuco em: 10/10/2013


Escolas fakes, alunos spam’s e os cavalos de tróia nas redes sociais

 quadronegro
Ultimamente tenho andado cansado, afastado das discussões e descrente no poder de mudança da sociedade. Sei que desagrados fazem parte do cotidiano de cada um nesse mundo cão. Minha profissão de educador não permite entregar as esperanças antes dos 60, é preciso sempre acreditar numa mudança futura, onde paradigmas sejam quebrados e, novas ideias, formas de pensar e entender a sociedade permeiem o início de uma “nova era”.

Gostaria de acreditar nisso, talvez, ainda bem lá no fundo existe uma luz verde que pisca em momentos como esse e me diz: Não desacredita, não perca a fé e lute pelas suas ideias, confie em você próprio e não espere muito do mundo, pois ele é injusto com todos. 

Mas afinal de contas, o que isso tudo tem a ver? Por que estou fazendo todo esse alarde num texto que deveria refletir sobre o ambiente escolar e as redes sociais? Justamente porque esse cansaço está ligado ao que vivo e vejo nestes locais. Vamos aos fatos!

As redes sociais me fascinam, sou um viciado, dependente cibernético que condicionou boa parte do seu cotidiano para esse universo virtual. Se hoje as redes me fascinam pela dinamicidade e facilidade de comunicação, por outro lado, elas também são responsáveis por parte de meu cansaço mental e descrença num futuro melhor, pois expõem o que há de mais raso e mesquinho habitando nas entranhas da sociedade.

Uma breve incursão por uma escola estadual de ensino médio da cidade me serve como elemento de análise. O uso do uniforme não é uma exigência legal, ficando por conta da instituição a obrigatoriedade ou não deste. Antes que me critiquem pelo o meu posicionamento, gostaria de deixar claro que sou contra qualquer tipo de atitude alienante, que desconsidere a liberdade de escolha do indivíduo. Acontece, porém, que o uniforme coloca todos os alunos em um mesmo nível visual, o da vestimenta. A não utilização deste, torna o ambiente escolar mais segregador e quando analisamos os adolescentes do ensino médio este fato fica evidente.

Existe uma tendência natural e compreensível dessa faixa etária em externar o aspecto visual como forma de afirmação frente ao seu grupo e à sociedade. Dentro disso, os alunos ostentam no ambiente escolar determinadas marcas de roupas, calçados e acessórios que, por fim,  transformam-se em signos de identificação, diferenciação e exclusão.

A descaracterização do aluno da escola pública estadual ,contraditoriamente, tem uma característica: o boné - a “bombeta” ou “panelão” como são conhecidos - juntamente com os fones de ouvido predominam no cenário. No decorrer dos anos esses acessórios se transformaram “em uma parte do corpo dos jovens”. Solicitar para que o tirem da cabeça é uma afronta despótica, atitude inadmissível dentro de um ambiente onde o professor perdeu autoridade devido às teorias pedagógicas que humanizaram demais o ensino e, por consequência, resultaram na perda de autoridade e de autonomia da escola.

Dentro da sala de aula poucos sabem o conteúdo que está sendo trabalhado, emana de seus olhares o desprazer de estar ali. Existe dificuldade, por parte dos alunos, em acatar ordens dos professores. Qualquer pedido, cobrança é facilmente entendido por ofensa, levado para o lado sentimental e o aluno se entende como vítima.

Os pais delegam à escola o papel da educação. O professor cobra postura do aluno. O aluno se sente injustiçado, perseguido, por conseguinte, reclama do professor e o professor culpa o Estado pela situação. O Estado não paga o piso, bate no professor, investe pouco em educação e exige muito de seu trabalho. Uma bola de neve que  só serve para expor a degradação do atual ambiente escolar.

O resultado desse cenário pode ser verificado através de uma pequena amostra grátis do novo termômetro da sociedade, as redes sociais. Uma grande massa desconhecedora dos assuntos, compartilha, curte e expõe suas opiniões embasadas em spam’s, fakes, hoaxes, virais da internet, elaborados, na maior parte das vezes, sob forte teor ideológico extremista.

Diariamente, assisto na time line e nos grupos fechados o show dos moralistas, dos antipetistas, dos antitucanos, da extrema direita, dos anarquistas, dos desinformados e daqueles que viram nas redes sociais a possibilidade de  externar e resolver todos os problemas do universo.

Yves de La Taille, psico educador da USP, destaca que um dos principais problemas do caráter educacional da sociedade se dá justamente com relação à informação. Existe a dificuldade de criar nexos, raciocínios entre os fatos, para transformar  informação em conhecimento.

O “show das times lines” pode ser visto como o produto resultante de uma sociedade embebida na informação rasa, fragmentada, sensacionalista, que se limita a entender um texto pelo o seu título,  que é incapaz de associar e interpretar aquela leitura como parte de um contexto histórico e social.
Portanto, nesse dia do professor, desejo que vocês criem muitos nexos, desacomodem-se, não desanimem frente ao cenário degradante da educação pública, lutem por seus valores e principalmente, resgatem o espírito da luta de classe histórica do magistério.

Para quem desejar saber mais sobre o tema autoridade e autonomia na escola, uma indicação de leitura: Yves de La Taille. Autoridade na escola. In Autoridade e autonomia na escola. Julio Groppa Aquino (org).

Texto publicado no site tucotuco em: 15//10/2014

Eu quero morar no Facebook

Redes-Socias-no-Brasil-Marketing-Social-o-que-é-são-rede-sociais-Brasil-Internet-Rede-Marketing-Digital-01
 Quando escrevi o primeiro texto para o Tuco Tuco comentando sobre a internet ser um veículo facilitador de acesso às informações, as quais nós escolhemos ver, ler e repassar, referia-me exatamente ao ponto que eu considero mais positivo dentro deste espaço virtual: a democratização da informação.

No entanto, nem tudo são flores. Existe outro ponto de vista (o lado negativo) que eu não me referi no primeiro texto e deixo bem claro que não estou falando de deep web, isso é matéria para outro escrito. Quando me refiro ao lado negativo, quero expressar justamente as coisas desnecessárias que acabamos vendo, perdendo tempo (pensando, escrevendo) e às vezes como eu, até me indignando. Este texto é um exemplo mais claro disso!

Não que eu me considere o baluarte da moral e da civilidade, mas digo isso exatamente pelo fato de que coisas ruins me fazem pensar e, por vezes demandam muito mais energia do que as coisas boas. Já dizia alguém aí que ‘as grandes ideias surgem a partir das crises, dos conflitos e dos momentos de reflexão’.

A internet, mais especificamente, as redes sociais, e ainda pra ser mais direto, o Facebook,  tornou-se uma grande janela aberta para o interior da vida subjetiva de cada indivíduo. É possível conhecer a personalidade de um ser humano pela sua página pessoal na grande comunidade?

Acredito que não por completo, mas é possível ,sim, traçar um perfil de comportamento e um padrão de conduta via feed de notícias e perfil. Cada post, curtida e compartilhamento, revela um pouco do que gostamos, expressa também as nossas identificações e o que almejamos como padrão de sociedade ideal.

O resultado disso tudo é que hoje o Facebook se transformou numa perigosa armadilha para qualquer ser humano. Dentre os milhares de analfabetos funcionais que convivem e compartilham ,diariamente, o mesmo espaço nas redes sociais, existe o sujeito esperto, que age justamente em cima da falta de conhecimento do grande público.

1 

Este sujeito faz desse nicho o seu hábitat de trabalho, respaldado “cientificamente” no discurso de Olavo de Carvalho, Reinaldo Azevedo e da nova sensação reaça, Rachel Sheherazade. Ele passa boa parte do seu dia se dedicando a elaborar imagens com frases e ,posteriormente, sair espalhando a sua produção na timeline e nos grupos fechados.

Quando me refiro à janela aberta para o interior da vida subjetiva, penso justamente nos significados que cada post pode ter. Alguns dirão que não tem nada a ver, que pode ser uma coisa de momento, sem pensar. Sinceramente, eu não creio. Acredito no fato de que cada postagem vem carregada de grande dose ideológica, sentimental e de personalidade.

É justamente aí que mora o perigo para a maioria do público que habita o universo das redes sociais. O principal problema, contraditoriamente, é a falta de informação, pois carecem de leitura, informam-se por títulos de notícias, comentários, e tem o Facebook como principal fonte. Este sujeito é a isca preferida dos abutres, alvo fácil para os mais ávidos sentimentos conservadores e reacionários travestidos no discurso da neutralidade apartidária que se apresenta como solução rápida e viável para varrer de vez a corrupção do Brasil.

Por outro lado, as redes sociais transformaram-se no local perfeito para morar. Trata-se de um mundo extremante justo e repleto de muitos amigos, pessoas bonitas de bem com a vida, inteligentes, politizadas, com uma visão crítica de sociedade. Se existe algum problema, este pode ser facilmente resolvido num simples comentário. Neste fantástico mundo, o gaúcho é a raça ideal, afinal de contas, o “Deus Maior”, Arnaldo Jabor nos definiu como o povo preferido. Luiz Fernando Veríssimo, outro ser divino deste mundo, optou por não condensar todos os seus escritos num livro só, ao contrário de uma tal de Bíblia, preferiu escrever milhares de textos e publica-los separadamente no decorrer de sua vida. Tati Bernardi e Marta Medeiros também foram canonizadas devido a sua grande contribuição bibliográfica para o entendimento do complexo universo feminino.

A popularização da internet no Brasil deveria vir acompanhada de uma evolução no setor educacional. Juntas (internet + educação) tornam-se uma ferramenta poderosa na formação do cidadão. No entanto, como já é de costume no país, a teoria da modernidade inconclusa mais uma vez predominou.

De acordo com o sociólogo José de Souza Martins, “o caráter inacabado da modernidade se expressa nos ritmos desiguais do desenvolvimento econômico e social, no avanço tecnológico, na acumulação de capital, na miséria e na injustiça. A modernidade anuncia o possível e não o realiza (Martins, 2010). Martins se refere às possibilidades que a modernidade abriu para a transformação da humanidade, mas que não é capaz de realizar e, pelo contrário, bloqueia o possível.

No caso aqui debatido, a inovação se apresenta através do computador, internet e inúmeros programas, mas o modus operandi permanece velho e retrógado, com um povo que não sabe ou tem preguiça de tirar proveito da informação, que opta pelo mais fácil, por ler o resumo em vez do livro.

 1781284_583253845099161_1090361083_n



Texto publicado no site tucotuco em: 02/02/2014



Pra que serve um vereador?

O que devemos esperar de um representante do povo na casa do povo?

Ora, justamente que ele cumpra o seu verdadeiro papel, que é legislar, fiscalizar o andamento das políticas em âmbito local, além de propor medidas, fundamentadas em estudos, que venham a contribuir para a melhoria da vida urbana e social de uma cidade.

Isso não me parece ser um tema tão complexo, de difícil entendimento. Na realidade, deveria ser de conhecimento geral. Qualquer indivíduo deveria ter a obrigação de saber quais são as funções de cada político, afinal de contas, estamos envolvidos diretamente com eles a cada dois anos.

Isso é algo que se aprende na educação básica, quando a tia nos ensina como funciona a casa, a escola, a cidade e o Estado. Mas enfim, talvez muitos alunos não estivessem dispostos a aprender isso, pois não iria fazer muita diferença nas suas vidas. As continhas de somar e multiplicar eram mais interessantes quando ensinadas com notinhas do banco imobiliário.
um vereador
Vereador de Rio Grande usando sua rede social
Ou talvez, por alguma ocasião torta da vida, o aluno tenha faltado a essa aula e, em consequência disso, não tenha realizado o tema, que era justamente a leitura do texto e a resposta de algumas perguntas sobre os direitos e deveres dos cidadãos. Os pais desse menino, que haviam trabalhado o dia inteiro, estavam cansados e não deram muita importância para fato do menino não ter prestado atenção e nem ter copiado a matéria na aula. Eles até deram razão para o filho, pois também achavam que a professora estava fazendo algum tipo de represália contra a criança. Por esse motivo o apoiaram em não querer ir à aula, afinal de contas, ele estava quietinho vendo desenhos em casa e o tirar do conforto do lar para assistir duas aulas de história seria uma crueldade tremenda.

Esse menino atravessou toda a vida escolar sem saber direito qual era a verdadeira função dos políticos que governavam a sua pequena cidade. Um dia ele completou 18 anos e foi obrigado a votar. Como não gostava de política, pois cresceu ouvindo seu avô - um homem do campo que veio para cidade trabalhar - dizer que “política, futebol e religião não se discute”, optou por seguir os conselhos do amigo, que iria votar no vereador que lhe conseguiu um emprego e um terno de camisas de futebol para o time.

O menino que não gostava de ir à escola concluiu os estudos do Ensino Médio num colégio particular da cidade, cursando EJA no turno da noite. Ele precisava do diploma para conseguir um emprego e, como existia a possibilidade de terminar o segundo grau em apenas 6 meses,  não hesitou e foi logo se matricular. Atualmente,  continua no mesmo emprego, trabalhando em uma indústria na cidade de Rio Grande.

Em relação à política, ele se atreve a dar alguns palpites, embasado nos comentários que assiste no Jornal Nacional e no programa do Datena. Não simpatiza com o governo, pois esse o extorque todos os meses com taxas e impostos exorbitantes que não são revertidos em melhorias na saúde, educação, segurança e infraestrutura urbana.

Acredita que a política de cotas é uma forma de beneficiar o negro que, historicamente, sempre teve as mesmas oportunidades e chances que o branco. Em relação ao atual Governo Federal, ouviu comentar que estamos diante de uma ditadura comunista, que tira dinheiro dos ricos para dar para os pobres. E os pobres, ao invés de estarem trabalhando, ficam em casa recebendo benefícios do Bolsa Família.

Vislumbra algumas mudanças no futuro do país, quando as coisas realmente funcionarem. Por isso, torce para que Joaquim Barbosa seja candidato à presidência, pois ele é uma pessoa idônea, que nunca precisou de cotas raciais e colocou na cadeia um bando de corruptos do PT. Diz que é preciso haver justiça, redução da maioridade penal, pena de morte e o cidadão deve ter o direito de se defender com as suas próprias mãos, já que o Estado não faz isso.

Atualmente, fez um perfil no facebook, onde passa boas horas do dia lendo as postagens de um grupo de discussão e informação dos acontecimentos locais.

Foi por meio dessa página que ele tomou conhecimento do trabalho de um vereador da cidade, que pela simplicidade e coragem de mostrar os “verdadeiros” problemas, já ganhou o seu voto para a próxima eleição. Afinal de contas, ele é do povo, é um homem simples, que não hesita em “largar na mão” dentro de um hospital pra defender o colega de bancada ou em mergulhar na valeta para mostrar os  alagamentos nas vilas.

Pouco importa se o vereador está cumprindo com o que manda a sua função, afinal de contas, o rapaz da história nunca se interessou por esses assuntos. Cresceu sem saber como funcionava o aparelho administrativo da sua cidade e acredita que ações iguais a desse legislador são dignas de aplausos, pois ajudarão na resolução dos problemas.

E até hoje aquele menino não conseguiu aprender para que serve um vereador...

Texto publicado no site tucotuco em: 26/03//2014